Caro "colega" José Manuel Fernandes,
(coloco parêntesis apenas porque não estou em processo de desvinculação da classe, por desilusão que nada tem a ver consigo)
Lido o seu editorial do passado dia 18 de Maio não posso deixar de lamentar que jornalistas que se pretendem sérios e credíveis se atrevam a dissertar sobre um país que não conhecem por causa de um acto ocorrido no passado ainda recente.
Vivo aqui há quase 3 anos. Não vivo na capital, mas no "pequeno reduto gaulês", chamado Roterdão. O maior porto da Europa e terceiro maior do Mundo fica aqui mesmo ao lado. 55% da população da cidade que é considerada "recreio" dos arquitectos é estrangeira ou descedente de estrangeiros.
Intolerância?
Dou-lhe o meu ponto de vista.
O holandês médio vive a sua vidinha e só não quer que o chateiem. Há apenas um princípio básico - a tua liberdade acaba onde colidir com a dos demais. Alguns chamam-lhe bufos, eu chamo-lhes justos. A bem da harmonia e bem-estar. Deixam entrar quem quer. Gente que vem para a Holanda e quer viver da mesma maneira que viviam nos países de origem - os holandeses aceitam desde que não colida com a forma de viver deles. Exemplos? Mesquitas e templos de oração de mil e uma religiões espalhados por todas cidades, um Carnaval cabo-verdiano promovido a festa da cidade de Roterdão, um ano Novo Chinês ceelebrado por toda a cidade com pompa e circunstância, festejos hindus celebrados numa das principais praças, um Dance Parede que fecha o centro da cidade, uma Gay Parade com o mesmo efeito na capital.
Uma cidade onde um polícia negro de rastas ou uma funcionária pública com piercings são coisas do dia-a-dia. Uma cidade onde por vezes fico com dúvidas se será europeia. Há zonas onde marroquinos, turcos, chineses, indianos são "reis e senhores".
Claro que há problemas. E começam, no meu ponto de vista, onde todas as raças, credos e convicções "importados" não se adaptam e querer "pisar o risco".
A Holanda é um país "meio-termo". Nada de exageros, nem radicalismos. Os outros que façam o que quiserem, desde que não forcem os holandeses a sair da sua normalidade. Aí eles estrebucham e "civilizadamente" tentam chegar a um consenso. Esse, a maior parte das vezes, chega infelizmente através da "ditadura das maiorias".
Os holandeses têm uma grande liberdade e presam-na. Mas aprenderam a usá-la com conta, peso e medida. Infelizmente não se pode dizer o mesmo de grande parte dos residentes que aqui "aterraram". Se queres ser tratado com um igual, comporta-te como tal, parece ser a bitola.
Fora isto, são um país como qualquer outro na Europa. Com taxa de criminalidade, de desemprego, de pobreza, com impostos elevados (mas onde NUNCA ninguém que ganhe mais que eu pagará menos impostos), com maus políticos (mas onde NUNCA haverá uma Fátimas Felgueiras ou um Isaltino, um Valentim ou um João Jardim...), com gente inculta e a eterna "lei da sobrevivência".
Do seu texto, lamento principalmente que, um português tenha a coragem de se arvorar em consciência crítica dos holandeses, quando em Portugal, nem aqueles que chamam "irmãos" que chegam do Brasil e África sabem tratar com tolerância e sem fobias.
ps.: O artigo em questão pode ser lido no blog do
Homem das Socas
Muitas vezes toma-se por tolerancia a falta de interesse e de empatia. Ainda que considere o holandes medio infinitamente mais tolerante que o portugues medio, tambem acho que se faz um grande alarido da tolerancia (putativa) holandesa. The grass is indeed greener on this side, but not that green anyway...
Quanto a tomar Rotterdam como exemplo fidigno da Holanda, acho que tens consciencia que o no resto da Holanda as coisas nao sao tao 'as claras como em Rotterdam... Em outras cidades ha' uma vasta populacao emigrante, mas ha' tambem um tratamento "estetico" da cidade que exclui estas comunidades da vista alheia. Basta vires a Utrecht para ver isso... Um exemplo de como Rotterdam nao tem nada que ver com o resto da Holanda e' o facto de os proprios Holandeses (nao Rotterdamers) regra geral odiarem Rotterdam...
Enfim, esta discussao daria (e ja' deu) pano para mangas. My point is: nem teudo e' tao bom quanto pintas!
Tripeiro, espero que tenhas enviado o teu texto para o Público. Seria serviço público!
abraços
fg